terça-feira, 14 de abril de 2015

As cores da infância


Um dia desses, me peguei sendo compelida a pensar em determinada questão que jamais me atentei antes.
Li uma notícia que falava sobre um fabricante de lápis de cor que havia produzido várias nuances para o lápis "cor da pele", e na mesma hora achei sua atitude brilhante. Comecei então a revisitar conceitos que aprendi assim, meio sem perceber, lá mesmo na minha infância trocando os lápis de cor, desenhando.
Neste momento, me lembrei de compartilhar a caixa de lápis de cor e enquanto pintava o desenho, pedia: "me empresta o cor da pele". Com isso, uma lição importante me foi ensinada, aprendi sobre compartilhar, porém o minuto seguinte me choca, o tal lápis "cor da pele"! Uau! Mas que sútil e cheio de preconceito! Começou ali, no auge da minha inocência a ser criado então, um padrão de ser humano.
Sim, aquela era a "cor da pele"! Mas, cor da pele de quem? Aquele ocre não dizia muita coisa, ou melhor, quase nada sobre a maioria das pessoas que eu conhecia, afinal eu conhecia gente bem branquinha, marrom, negra, rosada, mas ocre? Ocre não! E ainda assim, esse era um padrão que aos poucos me era ensinado.
Aprendi também nessa fase, que olhos bonitos mesmo eram os claros e cabelos se pudessem, deveriam ser loiros e lisos, é claro. Eu tinha essas características e ouvia comentários que as enalteciam ao mesmo tempo em que desmereciam os demais, e eu já sentia que seria estranho não tê-las, pois ninguém me acharia "bonita".
Via mães usando muita camomila nos cabelos de suas filhas para destacar sua "loirice" quase inexiste ou produzindo mechas artificiais, e elas eram apenas menininhas! E assim, mesmo com características aprovadas pela maioria, cresci tímida e sufocada pelos padrões. Nunca me achei bonita, interessante ou descolada. Fui tão bombardeada por essas exigências que preferia me esconder. Sempre pesei mais do que minha cabeça gostaria, por que aprendi desde cedo que bom mesmo era ser magra, e mesmo pesando muito pouco, me submeti cedo a intervenções cirúrgicas, que hoje tenho consciência de sua total falta de necessidade.
Achando-me tão esperta, ainda assim fui pega por esses padrões e neste momento vejo que tudo isso começou cedo, cedo demais para que eu pudesse retrai-los. Começaram nas questões simples, no livro de histórias que trazia como ilustração crianças brancas com seus lindos olhos azuis, brincando ou com cores que se chamavam "cor da pele". E a conclusão é óbvia... Quanta crueldade está inserida nesses padrões, quantas exclusões! Quantas personalidades subjugadas por não terem a cor da pele, o cabelo, o peso... Enfim o tal padrão!
Tudo isso me remete a criação dos meus filhos. Talvez por isso, meio que instintivamente eu diga que não os quero “sexistas” (diferenciando brincadeiras de meninos e meninas), e assim ensino que podem brincar de qualquer brincadeira, nada de separá-las de acordo com sexo.
Eles têm rodo, vassoura, assistem o filme “Frozen” da Disney, ao mesmo tempo em que são alucinados pelos super heróis. Seus amigos são os mais diferentes possível, porque o diferente é bom, aliás é ótimo! Quero e busco um convívio bem eclético, para que vivam realidades e verdades de mundos diferentes. Que frequentem a cozinha não só para as refeições, afinal, homens também podem cozinhar e ao mesmo tempo serem malucos por carros, se assim o quiserem, é claro. Quero que sejam boas pessoas, bons cidadãos e aprendam desde muito cedo que vivemos em um país de extrema miscigenação, e ser bacana está totalmente desligado de cor, raça, gênero ou credo, que estar fora do padrão é ser real, de carne e osso.
E definitivamente, que aprendam que a beleza vem da alma e que não existe coisa melhor no mundo do que "gente de verdade"! E porque eu quero tudo isso? Porque é a minha chance de contribuir para um mundo melhor! A minha chance de dizer:"ei, podemos e devemos ser diferentes"!
*Por Hellen M.


Um comentário:

Unknown disse...

Ameiiii!
Concordo com cada ponto e vírgula, filhos melhores para pais melhores.