terça-feira, 19 de abril de 2016

Direito de Escolha do Parto e Violência Obstétrica

Minha mãe não teve opção de escolha de parto. Minha mãe foi forçada a ter parto normal e sua primeira filha, tão almejada e amada, não sobreviveu. A irmã que eu não tive foi vítima de negligencia médica, assim como minha mãe também o correu risco de perder a vida.

Talvez por essas e muitas outras histórias, tão comuns, minha geração tenha tanto medo de parto normal. A gente aprendeu que é mais perigoso, mas traumático e mais doloroso.  Por que?




Porque naquela época a escolha da mãe pelo tipo de parto não era respeitada. Ou, melhor, a mulher não tinha escolha. Não devia gritar, nem chorar, nem mesmo tinha ainda o direito de ter acompanhantes na hora do parto. Quantas e quantas enfermeiras ainda criticavam quem "fazia escândalo"! Lindo seria parir silenciosamente.

Aí, quem podia (quem tinha um pouco mais de dinheiro) começou a preferir o parto cesárea, esse que foi se tornando o tipo de parto número 1 do Brasil. Imagino eu, que o motivo de todas as mulheres que escolheram cesárea seja o mesmo, medo de não poder mudar o plano de parto na hora H, medo de não suportar a dor, medo de morrer. Eram essas as histórias que nossas mães contavam! E o pior, eram todas verdadeiras.

Fez-se 36 anos que cercearam o direito de minha mãe de ter duas filhas! Sim, fez-se 36 anos que ela sofreu de violência obstétrica e tiraram dela a oportunidade de ver crescer sua linda menina "Andréia". 

Fez-se 36 anos que eu não pude ter a irmã mais velha que sempre sonhei, minha possível real amiga e companheira.

Fez-se 36 anos de uma injustiça sem tamanho, pois se na época houvesse a opção de escolha de parto, um parto normal forçado, mesmo sem condições naturais de fluir não teria prosseguido e, talvez, hoje, minha irmã estivesse aqui comemorando conosco seus 36 anos de vida.

A escolha da minha mãe foi planejar a chegada do bebê, tal como qualquer mãe que sonha com o rosto do seu filho, preparar tudo para recebê-lo, como um presente do Céu, e parir da melhor forma possível. 

Mas, ao invés disso, teve que se despedir da filha sem vida ainda no hospital, morta de forma trágica por consequência de um parto inadequado feito por um médico despreparado.

Andreia faz aniversário e eu não a conheci, não tive a oportunidade de dividir com ela minhas alegrias e tristezas, minha vitórias, minhas derrotas, meus segredos, minhas roupas e coisas, e - principalmente- o amor dos meus pais.

Não sei se ela teria preferência musical diferente da minha, se ficaria com o rosa ou o roxo, se ia gostar de salada como meu pai ou se herdaria os talentos artísticos da minha mãe. Quem sabe apreciaria os mesmos filmes que eu, ou me achasse uma maluca infantil ao ver minha coleção de filmes de Natal... Sei lá! 

De uma coisa eu tenho certeza: ela seria a melhor irmã do mundo pra mim, seria ela esta "pecinha" que até hoje me faz tanta falta no coração. 

Almejo que daqui há 36 anos, algo mude  e que um dia a mulher possa ser a real protagonista do seu parto e da sua história. Independente da via de parto (normal ou cesárea) e que, sobretudo, seja este mais humano, mais terno, mais sublime. 

Que nunca mais sejam sabidas histórias como a da minha mãe,  que sofreu a dor de nutrir e formar em seu ventre um ser perfeito que não pôde viver. 

Em contrapartida, que nunca mais sejam sabidas também de histórias de mulheres taxadas, antes de tudo, já como "incapazes de parir naturalmente". Que os partos não sejam mais um produto, um ritual frio e calculista, ou mesmo um espetáculo hollywoodiano com preços pré-estabelecidos para tudo, até pro "cineasta" que cobrirá o momento da chegada da criança. Mas sim, mais humanizados, com o direito de escolha adquirido. 

Seja num hospital de rede pública no interior do Brasil ou em uma das mais bem cotadas maternidades do país, que seja uma escolha conjunta da mãe e do médico, e que seja o mais emocionante e sublime da vida de todas as mulheres. Ricas e pobres. 

Pelo direito de nascer e de viver. Por todas as mães que perderam seus filhos no parto e por todas Andréias.

Bruna Chufuli Marcon

Mãe da Valentina (3 anos)

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2 comentários:

Unknown disse...

Filha querida!! obrigada por expor meu maior sofrimento,por falar tudo aquilo que ficou engasgado durante 36 anos da minha vida.
Obrigado por ser minha filha e mãe da minha netinha Valentina.
Amo de mais vocês.
Agradeço a Deus por você existir e muito emocionada após fazer essa leitura.
Obrigada meu amor maiorrrrrrrrrrrrrrr...
TE AMO
Regina Coelho Chufuli

Unknown disse...

Triste ....mas até hoje acontece essa desumanidade com mulheres menos favorecidas aqui na cidade de Santo André ....S P